Crime e Castigo (Dostoiévski)

Crime e Castigo

Não há muito a dizer, senão que é um dos melhores livros de sempre, uma verdadeira obra-prima, uma das mais influentes da literatura clássica. Lê-se compulsivamente!

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Excertos

Excerto

- Então, o que deseja? - disse a velha secamente, entrando no quarto e pespegando-se diante dele, como antes, para olhá-lo diretamente no rosto.
- Trago uma coisa para empenhar! - e puxou de um velho relógio de prata, de algibeira.
Tinha gravada uma esfera na tampa e a corrente era de aço.
- Está bem, mas não se esqueça de que o prazo do outro empréstimo já acabou há três dias.
- Eu pagarei em breve os juros do mês, tenha paciência.
- Ainda que não queira, meu caro senhor, não tenho outro remédio senão ter paciência ou vender aquilo que me entregou.
- Quanto me dá por isto, Alíona Ivânovna?
- Só me traz ninharias, bátiuchka; isso, fique sabendo, não vale nada. Da outra vez dei-lhe dois rublos pelo anel, mas na joalharia há-os novos por rublo e meio.
- Dê-me quatro rublos; hei-de resgatá-lo depois, porque era do meu pai. Por estes dias terei dinheiro.
- Rublo e meio, pagando os juros adiantados, e é se quiser!
- Rublo e meio! - exclamou o rapaz.
- Como quiser - e a velhota tornou a entregar-lhe o relógio. O rapaz guardou-o, e sentiu tal coragem que se dispunha já a ir-se embora; simplesmente, em seguida mudou de opinião, lembrando-se de que já não tinha tempo para ir a outro lugar e de que já anteriormente tinha estado em outra parte.
- Dê-mos! - disse com maus modos.
A velhota procurou umas chaves no bolso e depois dirigiu-se para o outro quarto, por detrás da cortina. O rapaz, que ficara só no meio da sala, pôs-se de ouvido à escuta, refletindo. Ouviu a velha abrir a cómoda. "Deve ser no gavetão de cima", pensou. "Costuma trazer as chaves no bolso da direita... todas no mesmo molho, numa argola de aço... E entre elas há uma maior que as outras, com o palhetão denteado, que nãoé a da cómoda... Isso quer dizer que também deve haver alguma arca ou cofre-forte... É curioso. Os cofres-fortes têm todos chaves dessas... Mas, enfim, tudo isto... é de somenos importância..." A velhota voltou.
- Aqui tem, bátiuchka; como a um rublo correspondem dez copeques por mês, a rublo e meio cabem quinze copeques por mês, que eu recebo adiantados. Aos outros dois rublos, que lhe dei da outra vez, correspondem, em relação a esta conta, vinte copeques, que também recebo já. Ao todo são trinta e cinco. De maneira que o seu relógio fica por um
rublo e quinze copeques. Aqui tem.
- O quê? Então agora é só um rublo e quinze copeques?
- É assim mesmo.
O rapaz não estava para questões e aceitou o dinheiro. Olhou para a velha, sem pressa de sair dali, como se quisesse dizer ou fazer alguma coisa e nem ele próprio soubesse o quê...
- Pode ser que eu, Alíona Ivânovna, dentro de uns dias lhe traga outra coisa para empenhar... de prata... boa... uma cigarreira, assim que um meu amigo ma devolva - e,como se atrapalhasse, calou-se.
- Está bem, depois falaremos, bátiuchka.
- Adeus... Mas a senhora vive sozinha? Não tem uma irmã? - perguntou, aparentando despreocupação e dirigindo-se para o vestíbulo.
- Mas que lhe interessa ela, bátiuchka?
- Nada de especial. Perguntei por perguntar. A senhora, depois... Adeus, Alíona Ivânovna!
Raskólhnikov afastou-se dali muito perturbado. E a sua perturbação ia aumentando cada vez mais. Quando saiu da escada parou várias vezes, como se estivesse subitamente preocupado por alguma coisa.

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