Escritor famoso
Caro Edson, perguntas-me o que deves fazer para seres um escritor famoso, uma pergunta difícil pois estou longe de o ser. Joga também contra mim o facto de ter escrito apenas três romances. Dizes-me que perguntaste o mesmo a outros escritores e que ninguém te respondeu. Embora não esteja mandatado para os defender (na verdade nem sei a quem te dirigiste), talvez não te tenham respondido pelas dificuldades que acabei de referir, ou porque não lhes sobra tempo, ou por qualquer outra bobaria, vá lá saber-se porquê. Pouco me dizes acerca de ti, limitas-te a dizer-me que tens vinte e cinco anos e que vives no Rio de Janeiro.
Correndo o risco de dizer algumas banalidades, começo por te dizer que tens de ler muito, e de muitas geografias se possível, não acredito que te tornes num Saramago ou num Jorge Amado se o não fizeres. Daqui a dez anos verás o mundo de forma diferente, não apenas porque ele está a mudar vertiginosamente mas porque tu próprio serás outro. Se pensares exactamente o mesmo daqui a uma década, alguma coisa terrível terá acontecido.
Já pensaste porque razão alguém se põe a escrever romances, ficções ou outro género qualquer? Já pensaste onde se inspiram os escritores? Mário Vargas Llosa, no livro «História Secreta de um Romance» escreveu, passo a citar: "A matéria-prima da literatura não é a felicidade mas a infelicidade humana, e os escritores, tal como os abutres, preferem alimentar-se de carne putrefacta".
Nada meigo, este Nobel da Literatura. O certo é que quando olhamos para os grandes clássicos ou para os contemporâneos, tenham eles origem em Freixo de Espada à Cinta ou na Patagónia, as obras mais absorventes são as que surpreendem, as que contam verdades dolorosas, histórias enigmáticas, enredos comoventes, narrativas incestuosas, prosas fantásticas de amor, de medo ou de traição. Estou a lembrar-me do Eça de Queirós, do Stendhal, do Oscar Wilde, do Victor Hugo, do Dostoiévski, do Lawrence Durrell, da Virginia Woolf, do Albert Camus, da Clarice Lispector, do Gabriel García Marquez, do Philip Roth, podia mencionar uma centena deles.
Perguntas-me pelo meu método de trabalho em termos de escrita, receio que não seja o mais comum, na verdade deixo-me arrastar pela história, é ela que me conduz, embora saiba para onde quero ir. Cada um tem o seu método, qualquer um serve se os resultados forem bons. Arrisco-me a sugerir-te que não fales de ti, prática comum de principiantes. Escreve e guarda para reler mais tarde, a pressa é inimiga da qualidade. Demorei nove meses a escrever o meu primeiro livro, um ano e meio o segundo, três anos o terceiro, receio precisar de vinte anos quando chegar ao sétimo.
Lembra-te da magia das histórias, da força das palavras, da coisa sublime que é escrever um livro. Escrever é uma forma de nos renovarmos. Se te tornares num grande escritor, lembra-te de Gabriel García Marquez que dizia que os escritores «não devem merecer mais recompensas nem mais privilégios que o sapateiro merece por fazer os seus sapatos».
Tal como os sapateiros temos de bater a sola de couro cru. Bater e modelar. Desejo-te muita sorte.
Seja o primeiro a comentar.