Banha da cobra
O que é que a banha da cobra tem?
Deitei-me com a barriga cheia de jaquinzinhos fritos e cervejas geladinhas e deu no que deu, uma noite agitada, sonhos atrás de sonhos e um pesadelo estranhíssimo. Devo ter ressonado como um rinoceronte!
Vou contar-te: sonhei que o meu trisavô, que foi coveiro no Cemitério dos Prazeres, de quem ouvi falar quando era garoto, me fazia perguntas de filosofia, pondo em causa as minhas “certezas”. Depois de me fazer navegar em algumas correntes filosóficas, afogando-me com questões e censuras, perguntou-me se eu tinha banha da cobra em casa. Ia-me batendo quando me ri e lhe disse que banha só mesmo na cintura. Soltou um palavrão e disse que eu estava muito enganado, e de seguida pôs-se a descrever tintim por tintim as maleitas que a pomadinha resolve: males do estômago e da cabeça, dores reumáticas, calos nas mãos e nos pés, assaduras entre as pernas, dores de dentes e de ouvidos, tremores e fobias, zumbidos, velhice precoce, febre amarela, dores da coluna e até do coração. Garantiu-me que ainda vivia graças à pomada. E pôs-se a dar exemplos de gente endinheirada e do poder que não passa sem a banha.
E a onça?, perguntei.
Qual onça?, eu falo-te de coisas sérias e tu falas-me de animais, retorquiu, cofiando o bigode. Respondi-lhe então, citando Mill, que é melhor ser um humano insatisfeito que um porco satisfeito. O que lhe fui dizer... O meu trisavô pôs-me as mãos na garganta e só não me estrangulou porque entretanto acordei!
Vou ter de investigar melhor essa coisa da banha da cobra...
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