A Valsa dos Pecados

A Valsa dos Pecados

O desaparecimento misterioso do pai e a polémica que se gerou à volta deste e de outro acontecimento mudam os alicerces do narrador da história. Os anos que se seguem são marcados pela guerra, por um amor apaixonado mas ameaçado de barreiras, pela forma como se escraviza na teia dos seus sentimentos, pela embriaguez do enriquecimento, por uma relação adúltera que o milionário esconde da lei dos homens e dos juízos morais. Juízos morais que nos levam a uma interrogação de fundo: de onde vem a cultura, como se generaliza?
Através de uma história intensa e a espaços divertida, a A Valsa dos Pecados de Carlos Porfírio, questiona ideias feitas, e até onde a ambição nos pode levar. Um romance corajoso e desconcertante que ficará certamente na memória dos seus leitores.

 

#aValsaDosPecados 

Opiniões

Carlos Porfírio guia-nos, através do narrador, por um salão colorido e variado chamado vida. A cada passo ternário, um novo acontecimento que marca a vida desta personagem é-nos apresentado, e passamos a vivê-lo através dos seus olhos. Tanto nos sentimos a girar maravilhosamente pelas zonas mais iluminadas como tememos - e quase falhamos o passo nessas alturas - os cantos escuros do salão.

Alina Timóteo

Carlos Porfírio tem uma escrita cinematográfica, enxuta, mas rica, que nos deixa ver o que descreve, e uma imaginação romanesca atenta aos comportamentos mais insuspeitos dos personagens, onde ninguém é totalmente virtuoso nem totalmente ruim, mas simples seres humanos com as suas contradições, capazes a cada momento de nos surpreender – e de se surpreender.   #AntonioPedroVasconcelos

António Pedro Vasconcelos

A Valsa dos Pecados é uma viagem de um personagem e do seu mundo pelo final do século xx português e pela entrada no novo século: atormentado pela guerra colonial, por amores desavindos, bafejado pela sorte na carreira profissional, arrastado pela vida, o homem desta ‘valsa’ chega ao fim sem ter deixado muito mais do que a marca da oportunidade, a busca de uma mulher e o facto de nunca se ter encontrado. Perguntará o autor se foi assim a nossa vida nestes tempos – e os leitores responderão.

Francisco Louçã

Para quem julga que os meandros da Guerra Colonial já não contam como elemento do imaginário português, mais uma vez ter-se-á enganado. Em «A Valsa dos Pecados», Carlos Porfírio recua com pormenor realista até matos e picadas, para depois descer ao lugar secreto da realização humana comum a todos os palcos. Assim, a história do homem que iniciou a vida como soldado da guerra e se prepara para morrer enquanto soldado da finança, resulta numa espécie de biografia consentida. Um romance de proximidade que se lê como se fosse uma narrativa de família.

Lídia Jorge

Criador e animador do Portal da Literatura, Carlos Porfírio revela na construção dos seus romances o conhecimento sábio da antiga arte da narrativa: acção, personagens, trama, suspense, são ponderadamente meditados.

Miguel Real

Excertos

Capítulo 3

E foi então que de repente vi uma imagem, a um tempo estranha e misteriosa, tão misteriosa que a minha satisfação e tranquilidade se começaram a desvanecer. Parecia-me um espantalho, a pouco mais de vinte metros de mim, daqueles que se vêem nas hortas e nas vinhas, e que mais não servem do que espantar as aves. Continuei a andar, olhei para trás para ver se via o meu colega… Um grilo estridulou calando-se logo a seguir. Com a aproximação e o silêncio súbito, alguma coisa me foi intrigando.

Capítulo 6

Como me lembro desse dia! A rapariga das tranças levava uma saia azul-turquesa, uma blusa creme e um colar de pedras azuis ao pescoço; calçava umas sandálias grossas, feitas de pneu, e carregava uma mochila de cor azul às costas. Pelo caminho, cheio de atalhos, disse-me que tinha uma coisa importante para me dizer, mas que só no regresso me diria. De nada valeu insistir. Parámos numa cascata de extraordinária beleza e eu senti-me logo encantado com o chilrear dos pássaros que, pendurados nos ramos dos arbustos, pareciam estar a falar sobre nós. A água gemia entre as pedras, fluindo para um riacho em cujas margens se viam uns pequenos arbustos com flores vermelhas e amarelas que exalavam um cheiro doce. Uma espécie de santuário da natureza. 

Capítulo 6

Sempre achei extraordinária a sensibilidade da minha artista. Não me refiro à pintura mas à forma como ela percebia os sentimentos dos que a rodeavam, em geral, e dos meus, em particular. Sentia a mudança dos meus humores como quem sente a temperatura de um corpo, e sabia moldá-los com uma palavra ou um simples olhar. Atrevo-me a dizer que o seu sorriso era diferente, era o seu jeito de entrar na alma das pessoas. Suavemente, como quem passeia por um jardim. É claro que a sua simpatia nem sempre era bem interpretada, havia conquistadores baratos que num minuto achavam que lhes tinha saído a sorte grande!

Capítulo 11

Riscado o meu velho eu, a vida tratou de redesenhar um novo e com novos olhos. Foi uma espécie de renascimento físico e psicológico – voltar à vida é como renascer – ainda que as velhas memórias tenham permanecido. Nesse novo eu tudo se alterou: a percepção da vida, essa roleta, que nos faz girar quando menos esperamos; a forma de olhar para o dinheiro, esse carniceiro, que tudo come desalmada e insaciavelmente; o desejo de sucesso, esse feiticeiro, que pouco a pouco foi tomando conta do meu espírito.

Capítulo 14

Gostava das duas de forma diferente: uma lembrava-me uma gazela assustadiça no meio da savana, a outra parecia uma leoa capaz de atacar mas também de proteger; uma era sedentária, a outra corria dez ou mais quilómetros duas vezes por semana; uma era submissa, a outra tinha um espírito independente; uma simbolizava a moral e uma vida concêntrica, a outra representava a rebeldia, a aventura, o saber viver um dia de cada vez; uma mal olhava para o espelho, a outra fazia da aparência um bem precioso; uma era o cântaro, a outra a própria água; uma era distraída, à outra nada lhe escapava; uma era bela por dentro, a outra belíssima por fora.  

Capítulo 13

Puxei de um livro e tentei ler. Debalde, o meu pensamento estava com a tailandesa. Durante largo tempo não fiz senão relembrar as imagens que ela me deixara. Há recordações que nunca desaparecem: a figura soberba e provocante mas ao mesmo tempo graciosa, o olhar vivo e perturbante, a energia selvagem, os trejeitos quando sorria, o modo como acariciava os cabelos, as curvas das pernas, os seios por baixo da camisa cor-de-rosa! Lembrava-me, é claro, de tudo o que tínhamos conversado. A ideia de a possuir enroscou-se e nunca mais me largou. Decidi que lhe telefonaria no dia seguinte.

Capítulo 14

Ao homem não basta ter sol e estar vivo, não basta possuir e ter a vida arrumada, não basta ter segurança e sucesso, não basta amar e ser amado. O ser humano quer mais, quer sempre mais. A vida não é justa nem injusta, é aquilo que fazemos por ela e o que ela faz por nós, disse para mim mesmo, tentando com isso justificar-me de alguma forma.

Capítulo 15

Apanhei-o, no pedacito da folha estava escrita a palavra inquietude. Percebi que se tratava de um título; apanhei todos os pedaços que estavam no cesto, juntei-os e li:

«Só uma louca como eu pode amar assim desta maneira. Com paixão, com silêncio, com desespero, com loucura. Amo-te por completo. Amo as tuas mãos, a boca, os odores, as mentiras, o cabelo, amo o teu ventre, os gestos, as palavras que não dizes mas que eu digo por ti, amo o teu sono que se apossa do meu, amo o mel e a faca que moram nos teus olhos e até mesmo a alcateia que trazes dentro de ti. Só mesmo uma louca como eu.»

Foi como se me tivessem atirado uma pedra à cabeça, devo ter mudado de cor.

Capítulo 21

Esta noite ouvi um barulho na porta das traseiras, eram três e meia da manhã. Lá fora o vento gemia. Assim que me levantei dei conta de que não havia energia eléctrica. Fui devagarinho em bicos de pés, dominado pelo medo, e colei o olho ao buraco da fechadura; só consegui ver um chapéu negro, desconfio que era o chapéu da morte. Voltei para a cama, acocorado no escuro, mas senti que havia alguém a observar-me. Que frio no estômago! Tentei levantar-me mas as pernas não me obedeceram. Fiquei quietinho e a transpirar, por fim lá o vi…

Comentários

Filipe Ribeiro

em 02 Abril, 2019

Caríssimo Carlos, Um único bilhete para várias viagens nesta Valsa. Da dimensão histórica `para a dimensão humana. Foi com enorme gosto que acompanhei na pessoa do narrador uma época onde caberá a geração do meu pai. Que também eu vivi e reconheço embora naturalmente de forma bem diferente já que devo ter cerca de 20 anos menos que o personagem principal. Mas fiquei completamente envolvido. Impossível ficar indiferente a uma guerra que fui percebendo que existia. Uma guerra dos nossos Natais em que os heróis que a televisão me trazia deixavam uma mensagem de boas festa e para mim o conforto de poder contar com eles para tudo correr como devia correr. Achava eu. Uma guerra que só mais tarde vim a perceber ter estado demasiado perto de mim. Afinal tinha 11 anos em 1974. Meia dúzia de anos passam depressa pelo que a tal proximidade era mesmo demasiado próxima. E hoje, a sua narrativa volta a acordar todos os horrores. Tão longa a guerra como todas as páginas intensas que lhe dedica. Nesta fase da narrativa, o personagem principal consegue seduzir-me. Deixa o quase estado de anti-herói para passar a ser alguém que merece a minha admiração. Os sofrimentos da guerra e dos amores tornam-no humano e próximo. Uma proximidade baseada na superação que sempre a todos nos toca. Depois passam os anos. E este personagem até simpático ganha ainda créditos pela sua capacidade de encetar outras e diferentes guerras. Num mudo desafiante e em franca mudança ele é capaz de lutar por garantir o acesso a um lugar na sociedade em que vive. Entre a ousadia, a sorte e a dedicação, resvala para uma espiral onde vai ser engolido. Depois foi a outra guerra. Outra guerra onde o personagem cavalgou para dimensões que o tornaram abjecto. Antipático. Só voltou a conquistar-me ao pintar com as mãos de uma morena. Mas são as suas pinceladas enquanto autor que me marcam com as múltiplas e intrincadas histórias dentro da sua história, com tantos personagens coloridos pelas coisas mais ou menos grandiosas ou mais ou menos pequenas que os prendem a uma existência sempre surpreendente. Amantes, infidelidades, poderes,, suicídios ou outras mortes. Vidas. Gostei mesmo muito e começarei outra viagem com Caídos da Mesma Árvore em breve. A minha vida familiar não me deixa muito espaço para a leitura pelo que me vingo nos aviões. Mas estou cheio de curiosidade. Assim, tenho de lhe agradecer os bons momentos que me proporcionou com uma escrita envolvente e directa. Penha tenho de não ter tido o prazer de conhecer os nomes dos amigos com que fiz esta viagem... achei genial. Afinal cabe-lhes todos os nomes. Eles são ao fim e ao cabo todos nós. E obrigado por continuar a escrever em português (diz-se antiga ortografia? para mim continua a ser presente). E que me perdoe a extensão de um comentário que nada adiciona para além do agradecimento e pedido para que possa escrever mais

Alina Timóteo

em 10 Julho, 2017

“He tried to name which of the deadly seven might apply, and when he failed he decided to append an eighth, regret.” - Charles Frazier Carlos Porfírio guia-nos, através do narrador, por um salão colorido e variado chamado vida. A cada passo ternário, um novo acontecimento que marca a vida desta personagem é-nos apresentado, e passamos a vivê-lo através dos seus olhos. Tanto nos sentimos a girar maravilhosamente pelas zonas mais iluminadas como tememos - e quase falhamos o passo nessas alturas - os cantos escuros do salão. Confesso que o início da obra me deixou momentaneamente confusa, com duas situações (de planos temporais diferentes) a serem relatadas em simultâneo. Para acrescentar à confusão, deu-me a sensação de que o narrador passava de uma situação má (estigmatizado por estar envolvido num crime que nada teve a ver com ele) para outra pior (viver como soldado em plena guerra colonial) - tudo de uma maneira que na altura me pareceu meia súbita. Mas embora pareça que alguns detalhes não voltarão a ser relevantes, eis que surgem quando menos se espera. Quando damos por ela, já demos um mergulho sem retorno. Tendo alguns elementos que aludem a obras como "O Retrato de Dorian Gray", "O Deus das Moscas" e "A Queda de um Anjo", assistimos ao declínio de uma personagem à medida que é 'exposto aos elementos' de uma sociedade que «tanto tinha de conservadorismo como de hipocrisia», fruto da sua época. Este tema da hipocrisia é uma constante palpável em toda a obra, e o que inicialmente revolta o narrador também a nós nos afeta, contribuindo para criar um laço entre o leitor e a personagem (que vai propositadamente enferrujando ao longo do percurso). De pecados veniais a mortais, o narrador vai cometendo uns atrás dos outros, tanto por ser vítima das circunstâncias, como por ser o resultado do espartilhamento auto-imposto da sua própria mente. Da aversão ao poder e à hipocrisia adjacente, torna-se precisamente no que desprezava inicialmente por necessidade (busca de liberdade ), mas depois por pura avareza. Enquanto testemunhamos a sua vida, somos confrontados de maneira não intrusiva a outro tipo de dilemas: repressão, as duas caras do poder político e respetivas consequências no campo de batalha, a robotização das pessoas visando o progresso (e perceber que o progresso, por sua vez, «tanto pode favorecer a liberdade como servir para nos acorrentar»), e - a que por fim mais nos atinge - a dura e amarga perceção tardia (e constante) de que o tempo perdido não volta. O tom da narrativa muda conforme os anos passam, o que se torna algo delicioso de se ler para quem estiver atento. Mesmo que não houvesse pistas sobre a evolução da idade do narrador (que as há), poderíamos percebê-lo simplesmente ao prestar atenção nas nuances do discurso utilizado, desde o tom sonhador e entusiasmado que associamos à juventude, à arrogância do pico da vida, à impaciência (q.b.) vivida da meia idade, e às repetições (muitas vezes saudosas), casmurrices naturais e doenças incapacitantes recorrentes na velhice... especialmente uma velhice assombrada pelo peso sempre crescente de um tremendo arrependimento. Uma obra que nos faz recordar, através das falhas tão humanas do narrador, do que realmente vale a pena viver neste grão de poeira cósmica.

Francisco George

em 27 Junho, 2017

Este terceiro romance de Carlos Porfírio é imperdível. Por razões várias mas, sobretudo, porque aborda a questão da guerra em África de uma forma ímpar. Linguagem atrativa e envolvente. A não perder, sublinho de novo.

Alexandra Machado

em 26 Junho, 2017

Terceiro romance do autor, Carlos Porfírio volta a deixar-nos agarrados a uma surpreendente história de amor, uma história de vida, enquadrada num cenário histórico que facilmente reconhecemos como nosso. Com a maestria da escrita inteligente e persuasiva a que já nos habituou, o autor dá-nos a conhecer uma vida repleta de emoções que nos estonteia como o rodopio de uma valsa e que nos conduz inevitavelmente à reflexão. Leitura imperdível, a que fazem jus os merecidos testemunhos de Lídia Jorge, Miguel Real, Francisco Louçã e António Pedro Vasconcelos.

Ana Maria Cabaço

em 23 Junho, 2017

" A Valsa dos Pecados " é um romance apaixonante que nos cativa porque nos convida a reflectir e a valorizar cada momento da Vida. Tal como numa valsa, rodopiamos, movemo-nos em várias direcções, fazemos escolhas, trilhamos caminhos... É um romance de emoções fortes, onde o Bem e o Mal se cruzam a Verdade e a Mentira se atropelam, mas coabitam. É a Vida na sua plenitude! Não há Bem sem Mal não há Riso sem Dor não há Inocentes sem Culpados não há Amor sem Desamor... Descrições vivas, múltiplas sensações visuais, tácteis, auditivas e uma linguagem rica transportam-nos para o centro de uma narrativa criativa, que se constrói a partir de um cenário de guerra e de um amor imensurável, de paixões avassaladoras, de encontros e desencontros... No final, somos brindados com um desejo, um desejo derradeiro, materializado através da imagem bela de " uma lua brilhante e cheia de luz ", uma lua capaz de iluminar, guiar e dar " luz ao coração do mundo" , não fosse " A Valsa dos Pecados " ter sido escrita com o coração! Adorei!

Verónica Sebastião

em 22 Junho, 2017

"A Valsa dos Pecados" é um livro envolvente da primeira à última página. A complexidade do ser humano e a escolha de caminhos entre o bem e o mal é algo sempre presente. Sacode-nos em relação à gestão de prioridades. Mostra-nos que as circunstâncias podem efectivamente moldar e alterar a nossa personalidade. Prova-nos que os bens mais preciosos não se alcançam através do poder financeiro. Lembra-nos que escolhas erradas nos podem acompanhar por toda a vida, como um fantasma. Um livro enriquecedor e sem dúvida alguma, uma lição de vida!

Sofia Carrondo

em 15 Junho, 2017

Tal como numa valsa, somos embalados por uma história de amor intenso, mas também de seduções subtis ou mais carnais, de paixões arrebatadoras, de vivências por vezes desconcertantes. Uma história de amor, dentro de uma história de um país e de um mundo no virar do século XX, narrada com uma linguagem fotográfica que nos agarra enquanto leitores. Uma história que dificilmente esquecemos, não só por ser tão real e genuína, como também por nos deixar a pensar sobre a marca que deixamos neste mundo...

Alberto Santos

em 06 Junho, 2017

Se o «Caídos da Mesma Árvore» me ficou na memória até hoje, «A Valsa dos Pecados» surpreendeu-me tanto ou ainda mais. Escreve bem este autor, agarra no leitor e não o larga. Parabéns.

Vânia Almeida

em 05 Junho, 2017

Li o livro em dois dias! É uma história sobre a vida de um homem, sobre o amor ou a falta dele, que subtilmente leva o leitor a avaliar as prioridades da sua própria vida. Levou-me a refletir de como é necessário estarmos atentos às sombras quando pintamos a nossa história de vida.

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